Eles seguem-me, mas eu não faço puto de ideia para onde estou a ir...

sexta-feira, 18 de março de 2011

Como explicar tantas coisas?

Li o teu mail e fiquei perturbadíssimo. Estou assustado. Tenho medo de ter percebido o alcance das tuas palavras... anseio que esteja enganado. A Helena Thadeu que eu admiro é a pessoa sincera e pura que não tem problemas em assumir as suas dúvidas, que são, no fundo, as dúvidas de todos nós, mas que só alguns têm a coragem de assumir. No entanto, quero continuar a acompanhar-te neste percurso sinuoso de busca das respostas... é uma luta árdua, intensa e contínua. Só para nós... os resistentes!
(Nuno Quintaneiro)

Esta noite, a última vez que vi as horas eram 06.40 da manhã e já entrava alguma claridade pela janela do quarto. E nesse espaço de tempo entre adormecer e não adormecer foi um inferno.

Escrevi um enorme texto mentalmente e até fiz "copy" de algumas partes para um outro texto que comecei a escrever também. Claro que tudo isto apenas aconteceu na minha cabeça. Ainda pensei anotar algumas ideias para não me esquecer, num bloquinho que tenho ao lado da cama para anotar estas coisas de que sempre me esqueço de anotar e depois se perdem no infinito da mente e não voltam mais. E agora estou aqui, sem fazer ideia do que escrever porque tudo se esvaiu esta noite em cascata e ninguém reteve nada.

E depois, que fazer? Há coisas irremediavelmente perdidas. E como explicar isso sem vestir o papel de vítima e fazer toda a gente imaginar mil e uma coisas feias de mim? Se tudo já se perde em mim há tantos anos e já nada fica o tempo suficiente para criar raízes, porque o espanto? E a dor?

Tenho frio.

Há algum tempo atrás foi quando se iniciou o processo do rapto; e começaram a roubar a velha Lena, aos poucos. Enfim, era inevitável, talvez. Por me ter tornado uma pedra no caminho para algumas pessoas. Era preciso afastar a pedra. E, irremediavelmente, afastou-se a pedra e pronto. Deixemo-nos de metáforas, não é?

Como fazer para explicar que ou me amam ou perdem tudo? Como explicar isso? Que saber amar-me é urgente. É urgente. Que fazer? É justo isso? É justo ser egoísta assim? E depois? Como explicar isso?

Tudo morre e tudo passa.

Eu quero essa Lena de volta e como fazer para trazê-la de volta?

Eu tenho saudades de quando me diziam que eu tinha os olhos bonitos, ou o sorriso lindo, que arrasava, ou era a menina de alguém. Já ninguém me diz essas coisas há muito tempo... Não precisam amar-me. Basta gostarem de mim assim…

Mas é urgente o amor. Sempre a espreitar... porque é preciso.

Isto já não está a fazer grande sentido, pois não? Este inferno que não acaba nunca. E nem foram eles que o começaram. Não é culpa deles sequer.

Mas estou quase. Estou quase, quase, a conseguir… Não sei o quê, mas a mágoa com que sinto isso deve ser qualquer coisa má. Que me dói fundo. Fico no ódio ou parto com ódio? Ou será amor? Afinal o ódio e o amor não se tocam? É uma espécie de ciclo à la pescadinha de rabo na boca. Qualquer das decisões vai me magoar. E agora? Como explicar isso? Não há nada para explicar.

”Tu vais encontrar outras pessoas que aos poucos vão ocupar o lugar deles. És uma boa miúda. E estás sempre bem disposta e alegre e na brincadeira. E sabes ser amiga. Sabes estar como ninguém. E isso é bom.” Alguém aqui saberá o que é perder anos de vida, uma história de amigos de adolescência? Onde e com quem aprendi a ser irredutível, intransigente, obcecada, lutadora… Que raio de despedida é esta para quem já tinha uma vida planeada? E isso custa-me tanto... dói, dói, dói...

Estas coisas entristecem-me. Mas há tantas outras coisas que também me entristecem e têm de ser assim. Vou dizer o quê? Abrir o jogo? Não posso fazer isso...

Como é que eu faço para explicar tantas coisas? Depois dele morrer havia um tempo em que eu contava os dias que passava sem pensar em morrer. Hoje conto os dias que passam, que simplesmente passam. Acordo e penso "Mais um". "Este já passou por mim". E às vezes ainda tenho tempo de pensar "Será que hoje também vai passar?". Geralmente passa. Custa muito mas passa. E passava melhor porque àquela hora no final da noite ele ia lá estar aquela hora e isso já enchia o meu dia todo. E o dia todo era vivido em função disso. Porque é das poucas coisas que ainda me prendiam à vida. Mas estou a estragar tudo. A deitar tudo fora. Alguém me disse na altura "A tristeza pegou-o na altura errada da vida dele". Sim, e? E a mim? Porque não pega?

Sim, sim, podem fechar a boquinha. Eu enlouqueci mesmo. Acho que é óbvio, não?

É um problema meu, eu sei. Esta mania de querer proteger toda a gente às vezes é difícil. E acompanhada desta mania que eu tenho 150 braços p'ra poder dar um a toda a gente também tinha de dar para o torto, porque depois ou perco os braços todos ou fica alguém a chuchar no "braço" porque não há braços que cheguem. E esta minha mania é que está a destruir tudo.

Que é que eu faço? Eu quero voltar. Juro que quero. Não sei para onde, mas quero. Quero andar, andar, andar até encontrar o caminho para casa. Dizem que é aí que se encontra a paz de espírito.

Ainda ontem alguém me perguntava há quanto tempo é que não tínhamos uma conversa séria. E é verdade. Há quanto tempo? Tenho tantas saudades de alguém. E minhas com esse alguém.

Já vos disse, não quero que me amem. Não só porque é óbvio que não me amam nem vão amar mas só porque sim. Por uma questão de orgulho, talvez. Que é outra coisa que as pessoas acham que eu não tenho. É como no filme "Lolita", com o Jeremy Irons. Quando ao fim de dois ou três anos eles se reencontram e ele continua a amá-la e ela nem por isso e ele descobre que ela está grávida do outro com quem fugiu e cheia de dívidas e oferece-lhe o dinheiro todo que ela precisa. E pede-lhe para ela voltar para ele mas diz-lhe que a ajuda mesmo que ela não queira voltar. E ela fica de lágrimas nos olhos e aproxima-se para abraçá-lo e ele assume uma posição de defesa e diz: "Don't touch me. If you touch me, I die.". E agora talvez seja isso mesmo. Se alguém me ousasse tocar, eu morria. Por isso é bom assim.

Tenho pensado muito nele. Sinto mais falta dele do que quando ele morreu. De repente acho que morri com ele e só agora, passado estes anos é que dei conta que o meu corpo deambula pela terra, mas a alma perdeu-se algures.

"Não oiças muito a cassete, tenho medo que se perca o sentido se a ouvires muitas vezes". Isto pediste-me na primeira cassete que me gravaste. Tenho saudades também dessas cassetes. Vinham sempre com um bocadinho de ti agarrado nelas e, dentro, transbordavam de ti e nós ficávamos assim como que um pouquinho mais perto. E era tão importante quando estava longe...

Acham que deviam saber estas coisas? Eu gosto muito de vocês.

Tenho saudades de mim. Como naquele poema do Mário de Sá-Carneiro "Perdi-me em mim porque eu era labirinto e hoje quando me procuro é com saudades de mim.” Ou mesmo Vergilio Ferreira: "Há um silêncio dentro de mim. E esse silêncio tem sido a fonte de minhas palavras."

Não é bem assim pois não?

Como explicar tantas coisas?

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